Bastaria

Bastaria um amor simples.

Desses, que já nem se usa.

Fartei-me das complexidades

e das tantas singularidades.

Bastaria uma mulher

que se quisesse só mulher

e a mim, apenas homem.

Que nos isentasse da perfeição.

Que nos dispensasse da angústia

de não sermos Super-Seres.

Bastaria apenas poder acreditarmo-nos.

Saber-nos protetores e protegidos.

Bastaria um amor calmo

para vivermos a glória

de imperfeitos, mas sábios, corpos maduros.

Ávidos e capazes de prazeres prolongados,

pois eis que os amores já não se contam

e nem se jactam de obrigatórias performances.

Um calmo amor

em que tempo houvesse

para que o Expresso na cafeteria

fosse sorvido em conjunto

com a Dialética de Hegel.

E que impedisse que o esplendor

do Brasil de Glauber e Bandeira

fosse manchado pela cretinização

de um Mundo que contém

"Grandes Irmãos" televisivos.

Em que tempo houvesse para se saber

da infantilidade dos flertes inconsequentes,

dos ciúmes intolerantes

e das vontades indigentes.

Tempo para crer nas quimeras,

no Canto das Sereias

e nos Castelos de areia.

Tempo de viver

esse sabor de vinho maturado,

esse calor de mãos dadas,

esse aconchego de um colo

e de um carinho.

Tempo de viver

essa calma do mar de Botafogo.