Obra santa
Não sou santo!
Sou santeiro!
Disse o homem de fala e aparência simples
Talho madeira
Olho as pessoas, a natureza, os animais...
E com muita fé concluo minhas obras
Pego a madeira que já não é mais madeira
Mas pele... osso...
Chega a transpirar, misturando-se ao meu suor.
Às vezes sangra em minhas mãos, misturando-se ao meu sangue.
Mas não sou santo!
Sou santeiro!
E apesar de fazer do toco um “santo”
Não faço milagre, pois não lhe dou vida, apenas minha experiência e inspiração.
Se fizesse milagre eu seria santo
Mas sou santeiro!
E os “santos” que faço apesar de não viverem levam um pouco da minha vida.
Moldo o barro
Água e terra
E minhas mãos os modelam conforme meu querer
Faço-lhes bocas, mãos, pés, olhos...
Mas não lhes dou o essencial
O sopro de vida
Apenas os seco ao vento e ao sol
Não sou “santo”
Sou santeiro
Não tenho o poder de tornar alguém ou algo santo
Santeiro é apenas um título
Não um mandato com poderes supremos outorgados do alto
Pode a criatura ser maior que seu criador?
Sou santeiro não santificador!
Quem fez o barro?
A água?
O homem?
Não posso fazer uma de minhas esculturas bater asas e voar como a águia
Nem mesmo cacarejar como uma galinha
Somente fazer com que elas despertem no homem a imaginação
E ele mesmo crie em seu mundo sua própria ilusão
O bem ou o mal estão em suas próprias decisões
E se eu quiser ser santo posso alcançar esta dádiva
Mas por enquanto só sou santeiro
Vivo num mundo repleto de “esculturas” que me levam a pensar, imaginar...
Sei quem as fez e este sim é Santo
E apesar de eu não ser, tenho em mim um pouco de sua vida,
Também derramou seu suor e seu sangue para me dar uma nova forma
Pois aquele que vivificou ao barro se tornou como uma de minhas esculturas
Para que eu me tornasse uma de suas.