POEMA SEM FIM

eu e todos os vitrais dos olhos das aranhas

eu e todas as novas estranhezas da alucinacao

eu e todas as pausas premiditadas da eloquencia

eu e todas as repeticoes reveladas pelo diferente

eu e todas as vitimas que serviram de isca

eu e todos os mecanismos dos avioes a jato

eu e todos os barrancos deslizando

eu e todos os camburoes vazios

eu e todos os casamentos interespecie

eu e todos os chapeus de drag queens

eu e todos os contatos a distancia

eu e todos os desenhos de cartilagens das orelhas

eu e todos os escorços dos conceitos

eu e todos os infinitos desencadeados por um passo

eu e todos os monstros absortos na clarividencia

eu e todos os pneus queimando

eu e todos os remendos de meias e cobertores

eu e todos os salmos trans-oceanicos das baleias

eu e todas as vastidoes prostituidas por um vento atomico

eu e todas as almas compradas pelo demonio

eu e todas as antesalas da loucura

eu e todas as articulacoes das cordas vocais e dos dedos

eu e todas as agulhas de costureiras falidas

eu e todas as bencaos da luz e do aroma

eu e todas as bifurcações dos verbos

eu e todas as brincadeiras de golfinhos libertos

eu e todas as cabeças que já giram em trezentos e sessenta graus

eu e todas as calmarias de aguas cristalinas

eu e todas as camas de hospital na espera

eu e todas as caricaturas da astucia politica

eu e todas as circunvolucoes do intestino delgado

eu e todas as colisoes de estrelas

eu e todas as combinacoes de nuvens

eu e todas as compressoes ferais do cranio

eu e todas as cortinas nas cozinhas de avós viuvas

eu e todas as constelacoes recriadas pelos indios maias

eu e todas as desidratacoes da alma talentosa

eu e todas as dinastinas que se afogaram em mar raso

eu e todos os criterios da perfeicao homoerotica

eu e todas as dores psiquicas

eu e todas as enfinges rolando pelas laterais das dunas

eu e todas as escuridoes esfomeadas das pupilas

eu e todas as esperas horizontais da fome

eu e todas as espirais dos cadernos de aula

eu e todas as espontaneidades insondaveis da sensação

eu e todas as esquinas dos moveis

eu e todas as estridencias verde-claras dos marca textos

eu e todas as fantasias queimadas de carnaval

eu e todas as fofocas legitimas das bruxas

eu e todas as harmonias desconhecidas dormindo sob as bordas do universo

eu e todas as hipnoses de programa de tv

eu e todas as impressoes dos dedos dos lemures

eu e todas as inspiracoes coadjuvantes das grandes inspiracoes

eu e todas as inteligencias da realidade organica

eu e todas as interrupções de gravidez

eu e todas as memorias secretas dos protozoarios

eu e todas as mumias vendidas a dolar neste ano

eu e todas as pedras polidas pela relatividade

eu e todas as perdicoes evocadas por um cheiro

eu e todas as santas caidas, mas porque se jogaram

eu e todas as sensibilidades aquosas dos anfibios

eu e todas as tangentes hipoteticas dos circulos

eu e todas as taquicardias de funcionarios publicos

eu e todas as vaguesas incoerentes do corpo de cristo

eu e todas as vidas que se autocompreenderam

eu e todas as morbidades de poetas malditos

eu e todas as carcaças de anjos mortos através da inveja

eu e todas as chagas bronzeando

eu e todas as noticias sobre os outros

eu e todos os acertos de cientistas loucos

eu e todos os suicidios de animais domesticos

eu e todos os apertos de patas e de maos

eu e todos os caminhos invisiveis do xadrez

eu e todos os eternos retornos artificiais da alquimia

eu e todos os lados esquerdos dos corpos

eu e todos os prismas de chumbo

eu e todos os sentimentos ironizando a sua expressao

eu e todos os sonos mediocres do ocaso da vida pratica

eu e todos os timbres das borboletas de porta chiando

eu e todas as inflexoes do azeite sobre a agua

eu e todas as lajotas das paredes que viraram muros

eu e todas as luzes de fundo

eu e todas as maquinas enferrujadas em museus

eu e todas as necessidades das algas

eu e todas as obras de arte blindadas

eu e todas as ondas da respiração pulmonar

eu e todas as previsoes de futebol

eu e todas as sexualidades concebiveis

eu e todas as tonalidades do vomito

eu e todas as tonturas em que me sinto agora

eu e todas as xicaras novas no mercado

eu e todos os sintomas fascinantes da esclerose

eu e todas as totalidades salpicadas de racionalidade

eu e todos as olheiras sem solvente

eu e todas as tartarugas

eu e todas as tomadas conectadas

eu e todos os azares que chamarão a sua atenção

eu e todos os chaveiros de aluminio

eu e todos os amores dos astros, obsoletos

eu e todos as bibicletas nos montes de sucata

eu e todos as colheres

eu e todos as flechas enterradas na terra

eu e todos as rezas que a coincidencia realizou

eu e todos os clipes ligando flancos de barcos

eu e todos os cadarços manchados de adolescencia

eu e todos os lampejos de luz sobre metais

eu e todos os condicionadores de madeixas

eu e todos os albuns de fotos ainda

eu e todos os amendoins dourados do japao

eu e todos os angulos dos triangulos

eu e todos os ardores de placentas cruas

eu e todos os batismos ritualizados em piscinas azuis

eu e todos os bordados automaticos

eu e todos os buracos que ostentaram uma cruz

eu e todos os cachimbos marrons

eu e todos os calos fechados a qualquer toque

eu e todos os veredas impronunciaveis dos axonios

eu e todos os cansaços de alegria

eu e todos os caracois da razao aurea

eu e todos os cartazes de fãs escritos a mao

eu e todos os cartoes de credito de las vegas

eu e todos os catalogos de doenças incuráveis

eu e todos os chiados graves das chaleiras

eu e todos os ciclos de vida das bolhas de sabao

eu e todos os consensos virtuais das proximas geracoes

eu e todos os coracoes de pelucia em meio aos lixoes

eu e todos os desejos descontruidos pelo conhecimento

eu e todos os destinos inócuos dos semi-deuses

eu e todos os farois dos carros observados

eu e todos os enformigamentos das pernas

eu e todos os exemplares que possam ferir a especie

eu e todos os felinos feios

eu e todos os fogos pretos do isopor em combustao

eu e todos os hermafroditas verdadeiros

eu e todos os imitadores de animais

eu e todos os instantes descontinuos da febre

eu e todos os lencois dos leitos dos vampiros

eu e todas as lojas inundadas pelo furacao

eu e todos os mitologemas sociais do porco

eu e todas as polimatias dos mosquitos

eu e todos os musculos tesos

eu e todos os objetos que servem para guardar outros

eu e todos os odios adornando a anorexia dos martires

eu e todos os onibus derrapando ante cachorros

eu e todos os oraculos desmascarados, mas ainda bebados

eu e todos os orgasmos teatrais

eu e todos os potes de yogurte de morango

eu e todos os ossos dos meu esqueleto

eu e todos os paraisos que nunca eram para ter acontecido

eu e todos os peixes ornamentais que se entreve pela janela do vizinho

eu e todos os premios para artistas

eu e todos os publicos avulsos

eu e todos os pufes amarelos de biblioteca

eu e todos os quadros anonimos de sebo

eu e todos os ratos de cabeceira, a cordas

eu e todos os sais minerais das camadas geologicas de marte

eu e todos os santos gagos

eu e todos os sentidos sem matematica

eu e todos os sinais deslumbrantes de saida nos predios

eu e todos os sonhos curetados por sustos

eu e todos os alentos dos cremes de pele

eu e todos os suores de cavalos inteligentes

eu e todos os veludos de falsas grifes

eu e todos os vermelhos desbotados nas camisetas dos homens

eu e todos os viloes de brincadeirinha

eu e todos os vortices das mariposas

eu e todos os vulcoes submersos nos oceanos

eu e todos os suportes rigidos de mesas novas

eu e todos os ziperes de braguilha cindidos

eu e todos os pardais egocentricos, mas com asas

eu e todas as estrelas nao instrumentalizadas pela teologia

eu e todos os escandalos da cara de socrates

eu e todas as panelas mimetizando o tambor

eu e todos as amendoas nascidas

eu e todas as abobadas das lampadas incandescentes

eu e todas as almas virgens dos matadouros

eu e todas as atmosferas inospitas da reflexao

eu e todas as convalescencias do roxo

eu e todas as correntes sujas de ouro e patina

eu e todas as felicidades neuroticas

eu e todas as fumegancias de caldos amargos

eu e todas as logicas secretas dos afrodisiacos

eu e todas as orbitas oculares dos gafanhotos

eu e todas as perplexidades da consciencia filosofica

eu e todas as reverbaracoes do suicidio

eu e todas os hedonismos das hienas

eu e todos os extases das fragrancias orientais

eu e todos as suspeitas dos camaroes

eu e todos os anamorfismos dos buzios

eu e todos os castiçais amarelos

eu e todas as pestanas dos leoes e dos leões marinhos

eu e todas as palavras carcomidas pelo ruido

eu e todos os cubiculos da metropole

eu e todos os drapeados das toalhas estendidas

eu e todos os elevadores enguiçados

eu e todos os espantos desenganados

eu e todos os fantasmas das festas infantis

eu e todos os filmes pirateados aqui no terceiro mundo

eu e todos os interiores do berilo

eu e todos os ninhos de cobras e de andorinhas

eu e todos os que foram maculados pela voz do vento

eu e todos os sois enamorados-se em icaro

eu e todas as ideias das toupeiras de nariz estrelado

eu e todos os tratores ceifadores de soja

eu e todos os vapores de chas vespertinos

eu e todas as circunstancias incomuns criatividade

eu e todas as culturas coniventes com o seu passado

eu e todas as gaiolas para araras

eu e todas as miragens evoladas de asfaltos quentes

eu e todas as simbioses de seres inorganicos

eu e todas as consolacoes sem querer consolações

eu e todos os trava-linguas do nordeste

eu e todos os dentes de sabre empoeirados

eu e todos os despetadores atrasados

eu e todos os engates helicoidais dos parafusos

eu e todos os estilhaços de vidro

eu e todos os livros sem capa

eu e todos os microscopios debruçados sobre o virus

eu e todos os paraquedas abertos

eu e todos os perfumistas autodidatas

eu e todos os trens-bala descarrilados

eu e todos os uniformes de aeronautas