Pequena canção aos sobreviventes
Cantemos por quem, em vida, gritou contra a farsa e a mentira
E por quem, mesmo após a partida, alimentou nossa ira.
Cantemos por quem, na estrada, criou marcos nos guiando
E por aquele que só, fez-se em luz, iluminando.
Cantemos por quem, sem armas, enfrentou tropas, carrascos
E por quem, com o coração, fez de ameaças, fiascos.
Cantemos por quem, mesmo fraco, fez a opção da luta
E por quem, em sua crença, aposta nela, não a refuta.
Cantemos por quem insistiu, ante algoz mais violento,
Continuar a seara vendo a messe como alento.
Cantemos por quem o pouco que colheu, o repartiu
E por aquele que, na partilha, enfim, nasceu.
Cantemos por quem persiste em por no chão a tirania
E por quem levanta o povo buscando o fim da agonia.
Cantemos por quem, por justo, faz sua a luta que é minha
E por quem, por outras vias, a mesma luta apadrinha.
Cantemos pelos que insistem continuar a semeadura
Mesmo que a terra estéril não lhes devolva candura.
Cantemos pelos que dizem: “não há fim, só recomeço”
E por quem, não crendo assim, lustra sua placa de preço.
Cantemos então a todos que insistem na ousadia
De cantar algum futuro mesmo que em era sombria.
Cantemos a quem resiste, mesmo neste fim de mundo,
E faz do fazer canção busca do viver fecundo.