Remédio
Não tomarei
qualquer desses calmantes
que entorpecem os ouvidos,
que me deixam inquestionável
qual fosse o mundo já moldado
e seu sentido decidido.
Não viverei
como quem navega
rio sem curvas,
como quem voa
num céu sem nuvens,
como quem nega
as próprias rugas.
Prefiro o talvez
ao sempre e ao nunca.
Veja bem,
sequer me exigirei
ser zen pela saúde
sabendo que a inquietude
fez o artista em um temporal
esculpir o corpo de Buda.
Porque não me apartarei
da sinceridade que exige a vida
mesmo que a fantasia inexistida
seja a realidade porque sentida.
Não que eu viva
às vísceras a toda hora
mas prefiro a inquietude
mesmo no ar condicionado
à imaginar o calor
que deveras faz lá fora.
O remédio da vida:
o calor que nos aflora.