prelúdio de flores

há um rumor de vidas

quando o chão dá de morrer

no instante último dado a lutar

ele prefere o leito

prefere a si

e quer tanto se deitar

não queira se prestar

em testemunha

pois que tudo se dá

em hora que nunca se deu

em tempo de homem nenhum conhecer

em tempo de olho de homem nenhum versar

o instante em que o chão dá de morrer

sei porque sou vento

sei porque arrasto nuvens

para que se rebelem copas

e verdes de todas as estações

se ergam

e rios se amaldiçoem

- que rios não se gostam -

e córregos se rebelem mares

e trovões se agigantem

nessas horas que não se dão

de pássaros encantarem luas

e luas se derramarem

ao chão...

em gota:

um pequeno brilho

cortando o céu

cortando a gente

a gente que passa ligeira

à cata de limites sem fim

e segredos

desaba um brilho

um remorso, talvez

e logo tudo se acalma

o chão se esparrama, em si

cansado

trovões se calam

rios se amam

córregos adormecem

verdes se deitam

copas se penteiam

e nuvens nem há

e em sol de dia seguinte

eis que numa cicatriz insuspeita de chão

o mundo vê nascer uma flor

sei porque já cruzei rios tantos

e pontes

e poentes

e nascentes

e jardins

e sei de todas as últimas curvas

de cada palmo de chão

de cada instante

da hora que nunca se deu

Capiau da roça
Enviado por Capiau da roça em 15/12/2012
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