Cenário bucólico
Cenário bucólico
maria da graça almeida
Doce de leite, abóbora e coco,
beijo roubado da boca do moço,
rede estirada ao sol de relance,
livro da vida esquecido na estante.
Vento ventando cantigas de amor,
crista do galo empanada na cor,
lenha a estalar no tosco fogão,
cheiro gostoso de sopa e feijão.
Bicho que pica, coceira que vem,
tarde chegando no apito do trem...
Sapo coaxa sem graça, arredio,
garça se mira nas águas do rio.
Égua que trota levanta a poeira,
homem, voltando, traz pó na canseira.
Dona a acenar na porta da casa,
ave se assusta e apressa as asas.
Filho que chora, chupeta no chão,
pão ressequido na palma da mão.
Riscos no céu, a paisagem se turva,
luz que se apaga é indício de chuva.
Cruz na janela, uma vela acesa,
prato trincado faz mais pobre a mesa.
A sopa e o feijão da pouca tigela,
não chegam à gata, não há para ela!
Sono batendo, um sopro à chama,
corpo cansado impõe peso à cama.
Sonho do homem inda é colorido,
mesmo com fome, outro filho é bem-vindo.
Maria da Graça Almeida
Da antologia da Confraria dos Poetas