Coriolano

Coriolano

Não tinha tempo para dúvidas

incertezas, possibilidades

Nascera empilicado e excomungava

as coisas que passam

tecnologicamente velozes

Atinava que no céu não lhe cabia

Enquanto terceiros voluteiam

entre as luzes dos shoppings

(onde nunca é noite ou dia)

os grãos petrificam-se na ampulheta

intercadenciando as horas

Coriolano deixava manchas no espelho

e a estupidez demarcando ângulos

pois retornos é o que buscava

Matar é fácil, corroborava

Primeiro requer mudar de avenida

de trilhas, de cidade

mode escapulir das vistas;

trocar de rádio pra não ouvir as melodias

e escolher outra água-de-cheiro

É preciso atupetar o tempo

de coisas novas

bascuiar as casas de insetos

e curar bieiras

Andar composto

para atrair moças não-bulidas

e bagunhar a sorte,

crescer os olhos pro desejo

Matar é fácil

Necessário é não se embrechar de logo

não ser descalqueado

e, mesmo engiado, requentar-se sozinho

Matar é fácil

não de morte morrida, nem matada

mas de morte pensada

esquecida, relegada

Tudo isto Coriolano sabia

e tanto matou, a cada lua

que já nem conseguia

soletrar-lhe o nome

Apertava o gatilho do esquecimento

e apunhalava as costas da memória;

Coriolano aprendera e cravara

sua primeira cruz no massapê

Quem dera descobrisse

que difícil é fazer viver

- publicada em LINGUAJÁ, O TERRITÓRIO INIMIGO -