A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO SER
 
Como um artista tentando
Pintar uma aquarela
Busco fixar em uma tela
Aquilo que estou pensando.
Mas, qual, a imagem fugidia
E tão sutil como a fumaça,
E à medida que o tempo passa
Some um pouco a cada dia.
Por mais que carregue a mão
As cores ela vai perdendo
Pouco a pouco esmaecendo
Até que sobra um borrão
Onde nem se distingue forma,
Só cores embaralhadas
Como tintas misturadas
Sem critério, nexo ou norma.
Quando olho em meu passado,
Vejo os objetos do meu desejo
Postos num quarto de despejo
Como todo descartado.
E ainda bem que isso acontece
Memórias são como fotografia
Perdendo as cores cada dia
A emoção também arrefece.
O tempo é como um cadinho
Dissolvendo a nossa memória
Descarregando o peso da história
Pelos tropeços do caminho.
E assim tudo se reduz;
Feliz o homem que no fim
Puder se sentir assim
Tão leve como um grão de luz.
Deixando pela estrada do viver
A insustentável leveza do seu ser.
 
                                                ***
                                     
Nota: A Insustentável Leveza do Ser, obra do escritor checo Milan Kundera é um romance nihilista que mostra a vida de dois casais procurando no prazer dos sentidos uma forma de preencher o vácuo que uma vida sem comprometimento com uma ideologia, um amor, uma missão de vida, nos provoca. Na Techoslováquia dos anos setenta, as pessoas, vivendo sob a tirania de um regime marxista, cuja doutrina se esforça para demonstrar que a matéria prevalece sobre o espírito e toda a história humana se compõe a partir da necessidade que o homem tem de ganhar a vida e justificá-la de alguma forma, o autor descreve o quadro triste e sombrio da vida humana quando ela não encontra um propósito maior para guiá-la. A fugacidade da vida, o peso de ser nada, o peso da leveza do ser é a grande angústia das pessoas. A Insustentável Leveza do Ser foi um dos maiores best-sellers dos anos setenta justamente por abordar um tema muito em voga naquela época. É um romance a moda de Sartre, existencialista e nihilista, mas que no fim nos leva a uma profunda reflexão: não será exatamente essa leveza de ser que nos proporcionará a verdadeira liberdade?  

João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 22/11/2012
Reeditado em 22/11/2012
Código do texto: T3999144
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