[A Inundação do Amor]
[Intertexto]
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Quem anda neste mundo, se já viu, sabe:
certos amores são como as "enchentes de cabeceira" —
sob um céu limpo, um sol brilhante,
feito rápidas muralhas de águas viajantes,
a inundação surge de repente nas passagens dos córregos,
não há tempo para criar a mansidão de rebojos —
as águas inundam tudo, chegam ao topo dos barrancos,
arrastam os viventes que se descuidam em águas rasas,
escondem os caminhos de chegada e de saída,
e depois se vão, córrego abaixo,
ao encontro de outras águas...
Qualquer semelhança com a Paixão
é mera figuração da Natureza...
O Amor é uma tempestade não anunciada —
chove no longe dos olhos da gente,
e surge, com a força da lua cheia,
no topo da Montanha Mágica do Acaso
[é de lá que vem aquela música que inebria].
[Se eu analisar demais, perco-me,
e acabo falando sobre efemeridade...]
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[Desterro, 16 de novembro de 2012]
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Obs...
Quem viu, viu, e quem não viu, logo não vai ver mais, pois
todo poema é, jorgeluisborgianamente falando,
uma face que está por dissolver-se como a face de um sonho.
Assim, logo terei o prazer de exercitar a dissolução dessa [minha] face,
simplesmente apagando o poema — uma incrível facilidade destes
tempos "pós-Era das Trevas Modernas". algo assim, feito o clic
de um ataque cardíaco fulminante, um estouro de coronárias [poéticas].