Poeta de boteco
Naquela noite, uma noite quente e preguiçosa,
Eu vi andando na rua um homem,
estranhamente ele parou, pôs a mão no peito
e caiu de repente. Houve socorro, mas o coração
é bomba que explode e as vezes nem faz barulho.
O tal homem, em nada se parecia com mendigo, nem como gente rica,
era só um cara médio e cretino, que pensava coisas
cotidianas, que os outros também pensavam
mas pouquíssimos diziam,
Gostava era de cerveja gelada e de mulher quente,
de croquete, pastel e de futebol e de poesia
Seu mestre era Drummond, mas andava com
Quintanares a tira colo, caso alguém pedisse,
tinha repertório vasto, tudo de coração...
Nas altas horas da noite,
entre outros homens diversos, uns casados, uns perdidos,
empresários, cornos, bandidos, pretos, brancos, amarelos
todos amigos de trago, todos homens no boteco sabiam
que em alguma hora da noite,
do alto da sua necessidade de dizer rimas aladas,
viria o poeta declamando com destreza.
Às vezes dizia palavras suas,
cuja qualidade ninguém no boteco contestava
vezes apenas dava vida a outros de sua raça.
Já alguns clientes de outros bares,
ficaram sabendo de seu dom, da pronúncia embargada,
do olhar brilhante, da verdade que ecoava em cada sílaba,
e vinham participar daquele momento mágico...
Acontece que naquela noite, uma noite quente e preguiçosa,
todos sentiram falta de algo, entre risadas e histórias de boteco
os curiosos se decepcionaram, onde estava o tal poeta?
O dono do bar, os bêbados, todos queriam a sua dose
de arte. O poeta deixara,
nas memórias uma impressão, de que a arte era um alimento
que de uma hora pra outra se extingue,
desse poeta, ficaram manuscritos,
quem sabe aquele que os encontre,
acabe pegando o gosto pelo verso,
e se torne o poeta de allures.