De Compostela IV

Chove

e Compostela é um rio

com cantos de fundo.

Abrigam-se os turistas sob o arco de Gelmires,

gaiteiros acirram os foles porfiando com o trovão

que forma torrentes na Azevicharia.

Sobe a humidade dos séculos,

dos túmulos neolíticos, dos castros inundados,

apegando-se ao coiro e aos ossos,

como criança em perigo.

Chove

e chove mais,

e a vida decorre nos esgotos da chuva:

nas lagoas do Vilar,

além o mar do Obradoiro,

sob as cascatas dos Castanheiros.

Esmolantes transeuntes

pedincham uma sombra de varanda,

injuriando, raivosos,

em anacos o guarda-chuva.

Cai a chuva,

cai e limpa,

cai e lava,

cai e apaga...

E na bruma a cidade sonha

que foi feliz

antes de ser sagrada.