desabafo

olhar para trás

é deixar o banquete

posto à frente

e se contentar

com as migalhas

que se assentam no chão

da memória

é sofrer a fome insaciável

a sede infinda

e o sono das palavras

que falam sem alma

bonitinhas mas ordinárias

tadinho do bilac

do alvares de azevedo

e do gonçalves dias

tadinhos dos seus seguidores acéfalos

amarrados em suas rimas

aprisionados na monotonia

dos seus ritmos pobres comesticos

e contidos na consulta incessante e frenética

ao dicionário e ao manual

dos poetas domesticados

dos poetas premiados

dos poetas que contentam

com os elogios burgueses

e com as benesses do sistema

olho onde vivo

ando onde bate o sol

e a lua e as estrelas de luz

e carne

objetos que existem e doem

e me fazem ficar acordado

ligado

esperto

atento

enquanto as viúvas de bilac

alvares de azevedo

gonçalves dias

e as outras múmias rimantes

babam

no seu leito

imaculado

de sonhos e lembranças

Francisco Zebral
Enviado por Francisco Zebral em 27/10/2012
Código do texto: T3954467
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