o caruncho

O Caruncho

Quando lia autores antigos

À escrivaninha sentado

No auge da minha faina

Pelo caruncho fui perturbado.

Levantei-me de mansinho e

Pé, ante pé, devagarzinho,

O ouvido pus armado.

Ao saber o seu lugar,

Arranjei modo de ver

Se podia o bicho matar,

Pois tudo quer devorar.

Já de canivete em punho

Com a ponta muito afiada

Tentei apontar no furo

Que a fera fez à entrada.

É aqui que a fera está,

Vou-lhe dar uma picada

E morrer a farei já.

O bicho ficou calado,

Com certeza foi varado,

Foi uma sentença fina

Pro seu malfadado fado.

Já contente de mim mesmo

Com uma proeza assim

Fui sentar-me à mesma mesa

Lendo o Mestre Bernardim.

Mas qual é o meu espanto

Mal acabando de ler,

Ouço novamente o bicho

Querer a madeira roer.

Já cansado do zunzum

Que ele orgulhoso imitia,

Pus algodão nos ouvidos

Para ver se não o ouvia.

Este processo era bom

Para abater tal ruído

Mas omitia o som

Daquele verso bem fluído.

Desfiz o que estava feito

E cheguei à conclusão

Que neste humano peito

Ainda havia coração.

Meda, Portugal Junho de 1965 ( primeira poesia)

Luís Filipe F. da Silva

Luís Filipe Figueiredo da Silva
Enviado por Luís Filipe Figueiredo da Silva em 15/10/2012
Código do texto: T3933672
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