MADRUGA

o sonífero que perdeu o efeito, de maneira inesperada

a tv ligada

no meio da madrugada

a interrupção do pesadelo

que tive com as crianças monstro (como são todas)

a banda de jazz me interessando

equilibrando a minha anestesia

a minha apostasia

as guitarras velhas, propositalmente velhas

o instrumento de soprar que me confunde

(um tipo de trompete, acho)

um jeito de sofrer que é só meu

que não dá pra explicar

que não tem cheiro

que tem certas faltas

que só elas sabem de si

zapeio

como qualquer insone

os reality pornô não me servem

os pastores também não

vou tentar o dvd do pasolini

pasolini, o índio italiano

às voltas com a lente, com quem não se entende

talvez eu também desanime

talvez os 24 livros

na minha mesinha de cabeceira

talvez masturbação

talvez agora não

talvez daqui a uma hora e meia

talvez meu lance sejam as meias-verdades

e meu copo a meio-sangue

hoje meu cão me mordeu

cães nasceram para isso

e eu?

para que nasci?

vamos ver

quanta vida me vem

do céu

pendurada

em ponto de interrogação

meu paraquedas

de mar vermelho.