Orgulho
Amigo que é meu inimigo, afasta-te de mim
Pensas que não enxergo tuas torpezas?
Sim: vejo-te como poucos veem e creem
A destruição de todos nós é o que desejas.
Foste tu a causa das injustiças da humanidade
És um verdadeiro artista da desventura
Sua obra prima? A vil iniquidade,
Objeto de inspiração da maldade pura.
Deram-te vários nomes e teorias
Chamaram-te deuses, azar e diabo
Mas tu te escondes perto, ameaçador
Porque não estás em montes inalcançados
Nem nos confins do inferno, em adusta dor
É a mente humana seu abrigo amado.
És a mais terrível das tentações
Pois te disfarças, sedutor, em sonhos acalentados
Tal qual sublime pintor, desenhas os mais formosos quadros
Arte bela, porém ilusória! Qual do orgulhoso será a decepção
Ao ver a beleza da tirania se transformar em solidão!
Digo que és a fonte de todos os males e repito
Até o egoísmo em nós homens não passaria de mito
Assim como a chama vaidosa da satisfação pessoal
Sem a tua enganosa influência a nos mostrar falso bem no mal.
E qual outra causa teria a morte calculada
A miséria generalizada, tristeza infundada
Além da cegueira egoísta vinda de ti?
Não haveria também, meu grande inimigo,
A dor da vergonha, a dignidade ferida
Os falsos propósitos, os sonhos pueris.
Infantilidades, de fato: passagens da vida
Criadas por ti, a pretexto de conforto merecido
Mas que não passam de ideia falida.
Condenada é enfim a vítima de tua perfídia:
Triste ser, o orgulhoso!
Decadente, vê a própria imagem
E apaixona-se: é a própria mediocridade!
Enfermo da alma, traça planos doentios,
Roteiros infalíveis para se autopromover
Que o transformam em monstro, fera dos brios
A felicidade sem misericórdia julga entrever:
Vive para ela (e só ela); que morram os outros.
Tu és tal mancha que vive em cada um de nós:
Artista, criador e criatura - ou inimigo atroz.
E que venham amores, felicidades e venturas eternas
E até mesmo os sofrimentos, desde que sem remorsos
Mas que nós humanos adquiramos os sonhos nossos:
Dignidade sem brios. Virtude sem expectativa.
A morte do orgulho.