Tempero verde - poesia culinária

Tempero verde

Vede o tempero

tempero a minha vida

em uma culinária interior

de alto sabor

de nutricional valor;

o bem-estar sinto

e estar-bem comigo

é como um absinto...

Os convivas e passantes

vários errantes

e outros acertantes

caminhantes de errância intrépida

como eu, peregrino do Absoluto,

e com os outros - sou eu outro para o outro;

viajo nos sabores

e saberes de várias culturas

de hortas, hortaliças, hortigranjeiros

de performance doméstica

de gente simples

de gente de sentidos aguçados

de gente sábia

sabendo o sabor de saberes regionais, transcendentais, meridionais,

setentrionais, tropicais,

incluindo Tristes Trópicos, cru cozido;

tendo comigo à escrivaninha,

não entre números - ainda que apareçam e sejam importantes,

eis o fascínio, sim, que sinto pelas imagens e imaginário coletivo: mitos, ritos, híbridos de ontem e de hoje...

Os Selvagens, Evanoé, Moby Dick, Quo Vades,

ainda uma estante inteira de miragens

entre Dostoiévski e Cervantes,

Machado, Pessoa, T. Mann,

Da Divina Comédia ao Mário Quintana,

nas Quintas da Boa Vista,

vendo o deslocamento de Villas-Boas,

a coragem aventureira de Robson Crusoé,

ou viagens de Guliver ou Rondon

entre pisadas ligeiras das Amazonas,

as Cereias encantando a tripulação de Ulisses,

assistindo filmes e tendo a imaginação de professor

entre aulas e janelas

entre orelhas das noites acordadas em leituras

amargas ou prazerosas

desta quinzena de minha vida,

e o fundo musical

secreto e subjetivante

deixa-me em delírio num instante,

são viagens musicais

de Bethoven e Verdi,

Bach, Twkovsky,

leio versos fragmentários em vários cenários

desde os clássicos e modernos,

viajo sem sair da tela do computador

elaboro sentimento e teço emoções,

revisito paixões e corre quem sabe uma lágrima

ligeira e teimosa nas horas mortas,

de Jadir Vilela, Sebastião Bemfica Milagre,

Adélia Prado, Cecília Meireles,

Lygia Faguntes Teles...

A noite esvai-se

e, de repente, a aurora se anuncia,

o galo canta ao longe,

e a vida inquieta, vez por outra,

a cada minuto, esperta e crescente se impõe

com o astro rei,

exigindo sua orquestra luminescente,

empalidecendo ou fazendo dormir deste lado,

as estrelas de vários matizes,

enquanto minha estrela brilha aqui dentro

na noite de minha alma.

Meu interior não para e as paragens

fazem ruídos de folhas que passam no livro da vida divina...