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A poesia, ela mesma, não tem em si a noção de princípio, meio ou fim. Sequer de princípios.

A poesia não percebe ângulos, nem dimensões.

Não faz a menor ideia do que sejam limites. Exatamente é como o vento, mais que do sol a luz. Mais que do som, a velocidade. Que do Bem, a bondade. Que do Mal, a fealdade.

A poesia não fala e nem escreve.

A poesia e a inspiração se confundem em um só corpo volátil, uma espécie de energia.

O poeta dorme, a poesia nunca. A poesia é a composição fluídica do sonho.

Para dizer o que sente, o poeta é ser padecente e impaciente. Por isto deseja aprisionar a poesia. Ela, invariavelmente, escapa, escorre pelas rochas, muros, paredes; fulgura em raios, explode em trovões; corre nas águas dos rios e se envolve com o luar.

A poesia nos foge pelos dedos e é d’alma humana a hemorragia.

A deusa desenha rugas na face dos poetas, torna em prata a mais vasta cabeleira.

Infiltra-se na carne e ergue brindes.

A poesia não abraça e não se deixa abraçar; beija e não se deixa beijar.

A poesia usa e abusa, lambuza. E tão somente pelos poetas se permite fotografar.