Ex-igarapés

Mais uma chuva desaba na cidade

trazendo refrigério para uns

e para outros, medo da calamidade.

A chuva que lava nossas almas

também leva as levas de entulho

para os rios que cortam a cidade.

Rios não, são os ex-igarapés

em sua fase perene de esgoto

a céu aberto – cada um, um rio morto

cujas águas fecais podem matar.

São inúmeros que cortam a cidade

e cortam o coração só de olhar

sentir o cheiro podre que exalam

enquanto navegando em suas águas

vão pacotes de não-cidadania

descartadas embalagens de cinismo

restos grandes e pequenos dessas coisas

excretadas da falta de educação.

E quando vem a chuva benfazeja

trazendo o refrigério necessário

impõe-se em consequência o perigo

que transborda da nossa inconsequência

em matar quem nasceu pra nos salvar.