Junto à sombra de Perséfone
O que são os sonhos além de uma ilusão tentadora?
Ilusão essa na qual mergulhamos cegamente
Que faz do corajoso soldado um mártir, e do servo covarde um herói
Assim como transforma uma tirana em moça plena e apaixonada
Enquanto oferece a uma ingênua criança o poder de todas as coisas
É onde repousa a esperança da vítima, e a realização do predador
O que são as palavras além de mentiras enfeitadas?
Que se dispersam ao mundo com sua sutileza e rapidez
Causando-nos feridas profundas e danos irreversíveis
A cada intenção mal expressa, morando nas entrelinhas do sentimento
Tão doce, tão ardente, amável e demasiadamente cruel
A trivialidade que exprime o seu coração
Expondo a sua alma descaradamente
Enquanto oculta a verdadeira face de seu caráter
O que é o silêncio além das palavras que afloram na mente?
É a verdade que a alma apresenta ao indivíduo
Em que poucos são capazes de compreendê-la integralmente
É o cérebro tentando obter uma breve telepatia
Embora a comunicação seja realizada por gestos e feições
Que nos entregam despercebidamente
Enquanto preferimos não proferir coisa alguma
O que são os pensamentos além de caprichos?
É onde o verdadeiro ser de alguém arma o seu jogo
E vai vencendo os obstáculos junto da paciência
De modo que entregue uma falsa vitória ao adversário
Fazendo-o cair em sua armadilha mais simples
É o que nos mantém vivos, literalmente
Uma vez que faz sua conexão com a máquina que chamamos de corpo
Assim como nos protege da ira e ganância de nossos semelhantes
O que são os sentimentos além de impulsos precipitados?
Tão nocivos quanto o mais letal veneno
Que nos transformam em animais estupidamente irracionais
Quando a razão cai sobre um coração em pedaços
Ou simplesmente pela pulsação descompensada mostrando a fúria
Fazendo a mente trabalhar em cima de uma vingança
Oferecem ao indivíduo um excessivo medo de perda
Desfazendo-se de sua fortaleza impenetrável, cujo nome é frieza
O que são as promessas além de frágeis acordos?
São palavras e pensamentos juntos
Seja por meio da razão ou do sentimento
É o que nos prende a algo desnecessário
De valor tão baixo quanto à moral
De importância tão pequena quanto à ética
Já que agimos acima de tudo que acreditamos, ou deixamos de acreditar
É o vazio instalado na convivência terrena
É o que motiva a nossa busca pela futilidade
O que eu sou além do reflexo do fracasso de Deus?
A odiada e aclamada criatura sem salvação
Tão cínica quanto aparenta ser, tão perdida quanto se mostra estar
A criança que lançou os seus fantasmas ao passado
A que escreve sua superficialidade em um pedaço de papel qualquer
A que almeja identificar seus infinitos defeitos
Apenas para pôr em pauta todas as complexidades humanas
A que diz tudo em silêncio e nada revela em palavras
A que nada promete, sonha ou sequer sente
Mas que se exibe tão viva e altiva
Ignorando qualquer teoria tediosa e previsível
Essa criatura insignificante que adora imergir em seus pensamentos
Pelo capricho de deleitar-se de si mesma