NAS BOLHAS DE ALZHEIMER
Rasgando a gente por dentro neste interstício
Está este amor que se esconde por fora
E nos degola a face que rola ao seu doce encontro como sacrifício
Estou dentro desta bolha de Alzheimer
Eu não sei onde nos perdemos como polens ao vento
Esta deusa malévola do esquecimento
O tempo vai passando a distância
E numa destas esquinas não mais nos vemos
Abriu-se um vácuo imenso sem ânsia
Acabamos perdendo o fio da meada
A ampulheta espalhou seu pós
E como peregrinos e sedentos beduínos
Caminhamos pelas areias do deserto
Tentamos desfazer os esparsos nós
Pelos dedos de nossas mãos as lembranças escorrem
Tua boca carnuda até desgruda de minha face
Este enlace que vai ficando nos porões de minhas lembranças
Este espasmo esta contração de anamnese longínqua
Traz-me a suavidade da tua língua
Que na sede do meu deserto me mata a míngua
Esta maldita bolha de Alzheimer
Esta maldita droga Nepente
Que assassina a endorfina
Não me deixa reticências
Tira-me as saliências
Rouba-me tua essência
Tira-me os sinônimos
Tudo e todos são anônimos
Descolore minhas telas
Faz-me olhar pela janela
E não sei se os transeuntes ou eu
Estão dentro desta cela
De que lados estão
Tranquei-me por dentro
Todos ficaram pelo lado de fora
Olhos abstratos que são aqueles no porta-retratos
A quietude gerando a imobilidade
Adentrei no triangulo das Bermudas
Descendente de Manassés
Uma das dez tribos perdidas de Israel
E some-se a minha memória imortal foi-se o anel
Minha história perdida como o doce do canavial
Minha paisagem tosca ancestral sem elos
Minha passagem sem paralelos
É só de ida
Identidade perdida
Sem volta
Sem vida
Sem espelhos
Reflexos que o tempo congelou
Desdita
Descida
Decida
Vida
Quem é que me sobrou
Quem será esta sobra que sou?
Será que quem tem este mal
Saberá que tudo o que teve
Ele tudo sutilmente os roubou?
Quem sabe?