Lá no sertão.
Fui comprar pão,
graças ao bom Deus não é igual no sertão.
Não preciso andar quatro horas
para pegar um simples copo d'água,
compro meu pão fresquinho, sem preocupação.
Fui na padaria,
é na esquina aqui de casa.
Rapidinho, dois minutinhos
com estrada tranquila e nada sorrateira.
Não como no sertão,
que a estrada é de chão
sem sossego você olha,
e se depara com a cobra.
Aqui na minha rua é assim:
Sem onça ou capivara,
nada de armadilha
nem de mormaço à meia noite.
Nosso céu é molhado, cheio de água pra dar,
não como no sertão
seco, opaco
e sem passarinhos para cantar.
Lá no sertão mais parece um mausoléu de areia,
seco de dar dó.
Respiram o pó seco,
e afogam-se com farofa - único alimento.
Lá água é preciosa como ouro,
até há crimes por um balde d'água.
Acreditem, lá fumaça não tem vez
o calor mata e compensa.
É tristeza, é magreza
nada nasce, nada floresce.
Tudo murcha, tudo morre
sem vida gritam as criancinhas.
A mãe não tem comida
para dar a seu filho.
E o filho não tem força
para sobreviver.
A água está de greve,
e as eruditas choram.
As jovens prostituem-se por um pouco d'água
e os cafajestes enganam-nas com urina.
O facão derrama sangue,
e o assassino põe-se a bebê-lo.
Embebeu-se de sangue
pois água não tem ali.
As vacas são magras, sempre magras.
Não existe isso de época
das vacas e vagas gordas.
Lá sempre é magreza atrás de magreza.
O povo tornou-se seco
como o clima.
O povo tornou-se quente de morte
igualzinho o clima.
Graças a Deus aqui não é sertão.
Mas se Deus quiser, mande-me para lá.
Manda eu e meus irmãos de fé,
para lá ajudarmos.
Manda eu e meus irmãos de eleição,
para lá amarmos e amenizarmos.
Manda eu e minha ajudadora,
para lá casarmos.
Manda-nos sobre a terra árida,
tanto África quanto nordeste.
Manda-nos para o sertão,
para lá também vivermos.
[28/07/12]