Apenas a palavra

Apenas a palavra é mais linda que a brisa de agosto

A palavra que palpita e desafia

e se esconde entre o tudo e o nada

Só a palavra pode dizer liberdade

enquanto o sol tece a rosa

e o tempo perfuma as chuvas e os canteiros

Apenas a palavra tem a maciez das folhas novas da primavera

o claro das noites sem nuvens

o eco da tua imagem refletido em minha alma

Só a palavra tem o silêncio que evola-se no sopro do vento

que se ouve nos passos do bambuzal

o silêncio debruçado no princípio onde cantam os pássaros

Apenas a palavra, numa tarde efêmera e sem fim,

grava, na última pétala da rosa mais vermelha, um nome,

que não é o teu, por ser fim

Só a palavra tem o aroma dos jasmins e a cor de estrelas,

pequenos círios acesos na noite negra voltando ao mar

e caem, frágeis flores do tempo, sob o enigma das brisas

Apenas a palavra desenha nos céus borboletas,

dão ao riacho sentido para o serpentear das águas frias do inverno

e me trazem, de algum momento, a rosa branca num vento azul

Só a palavra não diz o que poderia ser dito

eu te amei, enquanto existiram as manhãs de orvalho

e os lírios pendiam das tardes lilases de um ocaso aceso dentro do mar

A palavra emerge da pupa, de algum jardim do passado, e cai aonde tem que cair

"No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por meio dele" (João 1:1-3).