SONETÃO DO BURGUÊS MORIBUNDO

Desagrego-me agora! Não me veio o emplasto não feito de Cubas e sim desabalada doença;

de carrossel cedido vou remorsando a vida, o bem que não fiz, tão sabido o quanto pude.

E no prelúdio do derradeiro instante, fervilho-me em perdão e louvor a toda santa crença;

por favor! Não deixem este arrependitório funéreo vagando ao rodapé de meu breve ataúde!

Travarei contigo desde agora, morte, uma palestra fria e mórbida na rabeira da lucidez;

por que amedronta-me assim? Já coloquei aos teus pés minhas nobres esporas, ainda não basta?

Chegada a hora crucial, conferir-me-ão o quê no além: inferno em chamas ou jogo de xadrez?

Ah…Anfitriei posudos homens em meu tapete, politiquei, não vi que tudo muda, tudo passa…

Eu que de concreto tudo tive na minha vida desregrada por demais,

findarei com conquistas e gabações, e os bons feitos à coletividade somarão ínfimo tempo;

pois não dei conta ou resposta, gesto ou respeito, nada aos meus iguais. Iguais?

E quando der por vir o inevitável e implacával rebento,

oh! Indesejável astuta indiferente austera de todos nós mortos imortais!

Valha-me apenas a catacumba! Não! Não ergueis a mim, nem mui leve na mente, imerecido monumento.

Eduardo Marçal Silva
Enviado por Eduardo Marçal Silva em 21/07/2012
Código do texto: T3789413
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