Eu Devia Ter Me Despedido

Diante do seu retrato

Castigo a memória

Soluço

Eu quase ouço sua voz

matéria fina em luz

Eu devia ter me despedido

Deveria ter virado

Mas não virei

Fui embora

Com o calor de seus olhos

Em minhas costas

O instante me dominou

Por inteiro

Por dentro e por fora

E só conseguia olhar para os meus pés

Contando os passos

Distante de você

Naquela tarde

Eu sabia

Eu sentia o perfume da terra

molhada que predizia

O cheiro fétido e quente dos bueiros

me batia a face e entrava pelas narinas

Eu devia ter me despedido

Era tudo que eu queria

Mas não pude

Abri minha boca

E meus pulmões estavam murchos

Eu não sabia

E nunca soube como fazer isso

Nem meu pai soube

Quando nos deixou

Por que você não falou nada

Devia ter escarrado sua raiva

Exalado sua ira em paus e pedras

Mas não, você ficou parada

SILÊNCIO

E esse silêncio maldito

Que esconde as palavras mais óbvias

te consumiu

Ainda hoje

Eu escuto aquele momento, aquele instante,

Aquele argumento

Um resumo que nos afasta e que agora

Jaz em papel e tinta

Na palma da minha mão

Diante do seu retrato

Mergulho fundo em seus olhos

E lhe trago de volta a vida

Exatamente

Naquele dia, naquela rua

Naquela guia

Mas como num filme

Eu me viro e reedito

Diante do silêncio

Grito

Mas não olho para trás

Eu devia ter me despedido

Alexandre Cardoso de Oliveira
Enviado por Alexandre Cardoso de Oliveira em 17/07/2012
Código do texto: T3782731
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