A GRALHA AZUL

Ao Gabriel Rübinger

A gralha pardacenta, sem destino,

Pediu ao Criador pra ter missão.

Então Ele entregou-lhe, como ensino,

Uma carnuda espécie de pinhão.

Ela diz, desconfiada: "– Pra quê isso?"

Ele diz com ternura: "– Pra levar."

"– Não pede em oração pra ter serviço?"

"– Tome o fruto, o serviço vai chegar..."

Devagar, ao pegá-lo, treme o bico,

A parte bem mais fina delicia.

Não deixa da fininha nenhum tico,

E a polpa rechonchuda guardaria.

Deixando pra depois, rápida, enterra

No solo em que a memória não lembrou.

De tanto procurar, sozinha, berra

Aos ventos, o pinhão que lhe deixou.

Passa o tempo, a procura se avizinha

Do temor. Mas olhando, vê crescida

Nas folhagens, a bela arvorezinha

Ensaiando as raízes nesta vida.

Protegeu como o céu cuida de esferas,

Abraçou como o mar abraça o céu.

Amava aquela árvore, que era

Presente do Divino Menestrel.

De muda, vira árvore frondosa;

Pendem galhos ao peso dos pinhões,

E a gralha sem descanso, prestimosa,

Vai comendo e fazendo plantações.

Então nasce das lutas, a floresta

Das mais lindas do Mundo – de araucária –,

Que enfeita o Paraná, que nos atesta

O carinho da gralha solitária.

Mas o Pai observou, sem que lhe tarda,

E alegre do serviço bem prestado,

Deu-lhe o tom azulado às penas pardas –

O celeste ao esforço dedicado.

***

Disse o povo que o céu de azul se talha,

Fervendo boca em boca, lendas várias,

Quando a ave plumosa, quando a gralha,

Semeia o festival das araucárias.