DESVELO
DESVELO
A lua espalha-se pela casa
Sem pedir licença nem nada.
Os sons humanos diminuem
Reduz o coração o sobressalto
Do deus Pan de todo dia.
A luz macia revela teus cabelos
Descobre teu rosto
Alumia teu corpo
O ventre ritmado
Ao ver-te assim, sem as armas da vida
Sem palavras que te defendam
Ou agridam
Contamino-me pela inocência da lua
Deposito minha armadura
Onde, um dia, guardarás a tua.
Tenho ânsias de abraçar-te
do mais terno abraço
do mais puro amor
Proteger-te das luzes azuis
Que rodeiam a morada;
Das notícias da manhã
Dos feitos humanos em desgraça.
Tenho ganas de cobrir teu sorriso
Acariciar a pele em descanso
Encher teu sonho com encantos
Ver teu corpo abandonado
Sobre a cama
Causa-me essa impressão de perigo
Esse medo absurdo
De que algo te aconteça um dia
E quero proteger teu futuro
Estar à espreita pelos muros
Defendendo tua vida com a minha
Que, perto da tua, sequer tem serventia.
Os soldados que cumprem o duro ofício
Para alimentar seus amores
De nada servem nessa madrugada
Quando velo teu sono dos pavores
Querendo absorver todas as dores
Para que nada te alcance em desgraça
Para que teus amores sejam felizes
Que teus filhos cresçam com asas.
Sofro por ti, antecipadamente
Para que nunca sofras inutilmente
Preocupo-me por um mundo melhor
Minha mão cobre a tua
Minúscula
Minha alma humilha-se
Meu coração encolhe
Envergonhado por ser apenas homem
Que tão pouco pode
Ajeito o lençol sobre teu corpo
Num último esforço
Para conter algum mal
Deito a cabeça no travesseiro
Imaginando como será
Quando cresceres
Preocupo-me com o amanhã
Revolto-me com o mundo que herdarás
Com os homens com os quais lutarás
Para preservar teu amor
Preocupo-me com o mundo
Que ainda não conhecesses