CILÍNDRICO

CILÍNDRICO

As engrenagens que movem meu coração

Lentamente engatam. Dolentes, nessa inércia

De assustar túmulos, vão se acoplando.

Energia que já não tinha, as atrita

Movimento na alma descoberta.

Devagar, passo a passar pelas coisas

atravessando pessoas nas ruas

Varando cenas de crime

Em busca de surpresa de alucine

O homem tonto de angústia.

Os dentes enfuriam, engastam-se

Com tal violência que um tranco

Me atira para frente surpreendendo.

Velocidade, enfezo, dor, impotência

Amuam-se no lugar da dolência.

Tudo passa rápido diante os olhos

Nada penetra na alma

Preciso de tempo nos novos tempos

Que me humilham diante os convivas

Que vieram para a grande festa.

Tudo parece-me novo, surpresa

Que até me assustaria de fato

Caso já não conhecesse tudo

Que vejo e que renego e vomito

Como não suportasse mais um trago

Um ódio desconhecido se apodera

Arranca dentes do maquinismo

Afina o óleo que protegeria

O aço do que roda furioso

Dentro daquilo que humano seria.

As pancadas em meu peito

Solavacam o corpo

Atiram-me, tonto e sem fôlego

A um canto qualquer da vida

Eu, que preferia um ponto morto.

Luzes se acendem nalguma enfermaria

Sirenes giram pela madrugada

Corpos são tragados pela voragem

As cadeiras de rodas vazias

Os paralíticos fitos na paisagem

Todos os meninos correm para casa

As mulheres parem novos cordeiros

Para serem imolados em oferenda

Mal afasta-se o presságio

Apresenta-se hirto o medo.

Tudo é forragem na estrebaria

Os cavalos vazam a madrugada

Seus cascos penetram nos ouvidos

Enquanto golpeiam as ruas

Com suas caudas em chamas

Não há desastre que os impeça

De correr amaldiçoados

Querem evitar o visto antes

pela mulher de amplo seio

que observava tristes serpentes em transe

Minha náusea de mim me sufoca

Estou debruçado sobre a montaria

Que me carrega para o dia

No qual encontrarei desconhecidos

Que me cumprimentarão alegando-se amigos

Está próximo o crepúsculo

Está presente o medo

Dentro de mim, algo se parte

Abalando a obra do bom oleiro

Que quisera feliz modelo

Pressão subindo aos pistões

Tuchos alucinados batendo

Meu peito sufocado se rompe

Extravasando o que tem dentro

Que é o de todos os corações

Lançado da montaria violenta

Escorrego pelo córner da rua

Amontôo em desordem as partes

Que antes se constituíam uma

Desfaleço sem pudor nem pressa

Antes que se fechem os olhos

O mundo que em mim entra

é espaço comprido e longo

sem fim e sem consciência

de onde nenhuma mão acena

Tenho medo nesse momento

Já que a fé retirara-se há tempo

A força que impede que tudo finde

Põe sobre meus olhos seu peso.

As lilases embelezam a chuva.