VÔO NOTURNO
VÔO NOTURNO
Ao deixar-me abater
pela mão inalterável da morte
que a tudo consome
e nada vê)
penderei a cabeça para a esquerda.
Minhas mãos dormirão
sobre a escrivaninha, serenas,
após tanto haverem visto e nada consumido.
As mãos do homem
tentam construir vida
enquanto as outras, as divinas,
acenam morte.
Acabados os discursos
todo retrato será um vôo solitário
sobre o idioma,
dissimilado, é claro, entre o dos pombos.
Telefones não tilintam mais.
Novidade as moças que passam
sob o outono cortante.
Navios forçando partida do cais.
As amarras rangem o esforço
segurando o vento e a liberdade.
A mão abatida sobre a cabeça pendida
acaricia a nuca com toque nervoso.
Depois, após o dever cumprido,
parte em direção ao pier.
Caridosamente, a mão outonal
desencapela a alça, sem olhar.
O barco, gemendo absoluto,
vara as ondas com presteza
gozando cada caturro de liberdade.
O timoneiro sou eu.