VERTENTES

VERTENTES

Quando rebuscares teus guardados

Encontrarás coisas que se perdem todos os dias

Acumulando-se em omniesconderijos

À espera de u’a mão saudosa o bastante.

Nas gavetas de bijouterias, um revólver

Um meio perfume, dois lencinhos amarelos

Não encontrarás os poemas que não fiz

Transmutados em fotos ininteligíveis

Quando mergulhares nessas coisas

Com a língua encrespada e rouca

Já terás empirismo no sangue

E a ti aquela parecerá ridícula pelo sido

Nas tuas sulfurações pedirás um braço

Um colo ou ombro onde verdejar

Soprarão ventos rudes de Saara distante

De um Gobi de vidro, recheado de livros.

Uma deusa, o uno feminino

A primeira mulher, tantos segredos

Lilith, macho e fêmea, omissões bíblicas

Sobre as verdades do mundo: desmoronas

Alexandria contida em Roma. Tua cultura

Tuas lâminas a mim não ferem

Antes, fortalecem:

O que não mata, enrigece,

Desperta a coisa secreta

Húmus do Nilo

Dormitando dentro da cheia

Ó mirone, desse canto solitário

Espreitas as bifurcações da solidão

Filosofando na distância

Quando a realidade te alcança

Ès pasta de músculo e indecisão

Arredas para o lado, com mão frouxa

O momento presente, apreciando o futuro

Debruçada na janela do passado

Sem nunca entender porque não intercedes

Crias no amor transfixo

Nas exortações de Cristo

Agora, impávida, olhas atrás

Perplexa com os ciganos

Chegando por terra

Onde só alcança o oceano

Com a alma burilada em sal

Vives de jornais e repercussões

E tu, com tua misantropia

Arredomada por fantasias

Atiras pela borda o melhor dos anos

Que se afogam na tua apatia

Súbito, teus dedos tocam algo

Que o cérebro reconhece incontinenti

Com a mão sobre o seio, apertando

Sentas na cadeira próxima, ao lado

Sucumbes, sem som ou fuligem

Até que nada reaja em ti

O telefone toca. Filhos acodem

-Nada. O dia afunda redondo

A noite de molas salta para dentro

de tuas retinas e depois te ocupa

tuas lâminas resvalam e não ferem

não desbravam o emaranhado à frente

tímida, avanças uma perna

teu pé ocupa lugar no presente.