REVELAÇÃO

REVELAÇÃO

A cidade dorme tranqüila

Inebriada pelo frio costumeiro

Enquanto o homem apodrece no quarto

Centímetro por Cm².

As carnes se desfazem, malcheirosas

No carrossel dos pensamentos.

O frio vento que carrega vocês

Tremolentes –fios de vozes –

Vai ocupando o corpo

Expurgando a alma, tomando

Conta do micro-universo que só

Deseja dormir suas estrelas

Cansadas de brilhar à luz do dia

Na labuta do pão atroz que não

Satisfaz a fome verdadeira que há

No estômago da consciência.

Raios de luz das lâmpadas da rua

Enregelam e caem sobre a calçada,

Vitrificadas: estrelas mortas.

No escuro do quarto sombrio

Um homem se pergunta de Deus

Confunde-se nas contradições

Despenca dos abismos da incerteza:

Corpo fluídico no espaço vão.

A cidade descansa nos primórdios

Do primeiro de maio.

O homem se mata na procura por si

Não há saída

Nem vê encontros.

Por isso apodrece, lentamente,

Centímetro por Cm²

No túmulo do quarto.

Talvez haja uma divindade

Em qualquer gaveta do arquivo:

O homem não arrisca.

Invade outros terrenos

Morre em outras cruzadas

Procurando e sabendo a resposta

Que não quer ouvir.

Guarda, em outros armários

Outros anjos e arcanjos

Que, confabulantes, comentam

Segredos e verdades.

O homem se nega,

Tem medo dos segredos

Que pode a si revelar.