RESUMOS II
RESUMOS II
Todos os amigos que tenho são felizes.
Não conheço nenhum a quem possa chamar desgraçado.
Todos eles riem deliciando-se com a vida.
Nunca conheci quem fosse miserável.
Apenas eu sou desgraçado
e levo uma vida miserável,
Assim vejo o mundo e assim o mundo me vê.
Quando caminho pelas calçadas
não vejo quem possa chamar infeliz.
E é mastigando meu infortúnio,
lendo frases nas paredes e muros
que vou entendendo que existem muitos desgraçados
que são infelizes
que acham que são os únicos
e que minha vida, a minha, a vida de quem anda
a torto pelas calçadas é uma vida maravilhosa
que nada tem de calamitosa.
Nas janelas das mansardas pelas quais passo
vejo gente sorrindo e velhos jogando cartas
respirando o ar que Deus lhes deu.
nas vielas dos mais sujos lugares
existe um ar de euforia; risos distorcidos
pela tosse dos cigarros
falas altas pelas generosas doses de conhaque.
Acalanto uma felicidade sem igual
que não desperta de seu leito.
Meus passos são rumor no silencio das ruas
dos beneficiados pela sorte, sucesso ou dinheiro.
Os jardins que são verdadeiros bosques
bem cuidados por aqueles que moram nos mocrifos esfuziados
regurgitam solidão de seus donos que vivem tristes
atrás das janelas fechadas e portas envidraçadas
d'onde observam tudo e s'assustam
com o rumor de meus passos
que pode significar algum perigo nessa noite
de quase chuva, quase gente, quase frio.
Os cães estão abandonados em quintais
abandonados pelo medo que nunca abandona os moradores
das casas que simulam lares abandonados
para evitar o perigo daqueles que produzem sons pelas ruas.
Meia-volta, volver! Embarco no auto
Engato uma primeira marcha ansiosa
e parto em direção às luzes que há pouco admirava
em ruas apinhadas de risos e falas alteadas.
Enquanto desenvolvo pelo Aterro
vou observando as luzes das casas que deixo
vou olhando dentro de cada casa
vou entrando em cada alma
e me compadeço
com o que vejo:
reféns do medo
Repente, quero continuar guiando para muito longe
quero esquecer as coisas que vi e as que vivi
muito mais as que vi
que as que vivi a mim pertencem
e o que foi visto é a peripécia do medo
malabarte que reneguei enquanto vivi.
E guio.
Dentro do auto
ao meu lado
uma felicidade imaginaria
sem mão e sem espada
vê minha alma
e se compadece
da minha ânsia
da minha estrada
que conduz a nada.