PERCEPÇÃO

PERCEPÇÃO

Na manhã pedregosa

os passos são negritos

no espelho diagramado da cidade.

Leads bocejantes aparecem

nas janelas dos prédios aos pedaços.

Nas suítes, a palavra de cada dia,

cozinhada, temperada para ser palavra geral

hemografada na página civilizada do jornal.

Humanografia estampada na banca

repleta de chamadas.

Perceptivo, passeio entre legendas

trespasso Etiópia, África

surjo em histórias dissolvidas em palavras.

Embeveço-me com a boneca ilustrada

O planeta agoniza à frente

da fera-besta comunicada, estimulada.

Minha boca reduz a pó

as migalhas de mim mesmo

guardadas dentro de cada matutino,

pousadas, fuliginosas, nas faces

negras, ressecadas, que espiam

curiosas, para dentro das casas

universalizadas onde a família humana

se debate, produz, procria e se mata.

Sou mil partes distantes

não podendo nada.

Sou o desejo faminto da tinta

de ser dissecada

expondo a ossatura de cada palavra.

a entranha trabalhada

maleada pela mão laboriosa, esmerada

que, se respirasse,

não escreveria tanto

e nada.

O deus linear dissolve

integra e absolve

os olhos extasiados

que se alucinam no ópio

das manchetes dependuradas.

Percebo, desmemaravilhado,

continentes que se tocam

China e Américas que se entrelaçam

Fundem-se

Culturas diferenciadas

formam uma estranha pasta

que ferve

na gutemberguiana panela

da primeira página.