PATRIMôNIO DOS CACHORROS

PATRIMôNIO DOS CACHORROS

As casas passaram,

encheram-se de rugas.

A tintura de cal das paredes

definhou, sem mao operosa

moramante, que lhe consolasse

as telhas que caíram, quebraram

ou o vento roubou.

A olaria há muito está fechada

pelo desamor às casas

que acabaram.

As pessoas, as que nao desabaram

partiram antes que ruísse

o corêto no meio da praça

onde a Banda Municipal tocava

para prefeito e homem Deus no palanque

sob o comando do Maestro Sandoval.

A riqueza crioula do cafezal

perdeu seu poder.

Enfeita hoje as beiras do córrego

onde peixes de todas as espécies

sem linhas e sem mao-de-homem

refugiaram-se e festejam

dias eternos de graça.

O ouro negro, que encheu bocas

vereadoras de ouro-oiro

e mandou lavar cortinas em França,

cresce a êsmo, sem ordem sem cova

pela cidade.

Nas noites de domingo

onduleia lentamente as copas

lembrando uma marchinha

tocada pelos flibusteiros da banda

que atacavam as mocinhas na quermesse,

atrás da igreja, onde se pudesse beijar,

sob o olhar de sol-e-dó do Velho Sandoval.

Somente os pés de café lembram.

Quem ficou, aprendeu desolaçao

e esqueceu.

Quem partiu aprendeu desolaçao

porque nao viveu.

É tudo desolado

sem lados, sem fim

feições de ontem

na incompreensao de hoje.

Os cães sabem o que é bom,

é feliz.

Tombaram a "coisa":

Patrimônio dos Cachorros,

chama-se assim.