OS EUS DISSOLVIDOS

OS EUS DISSOLVIDOS

O que não sou, não fui, não serei

amontoa-se pelos cantos da casa.

Tudo o que, por excesso de minha

coragem absurda, nunca ousei.

Há grande profusão de formas

nesses seres endovertidos.

Reconheço, nalguns,

gestos ou trejeitos

que lembram o eu dagora.

Mas todos eles, não sei como ou porque,

arremedam-me nas poses, ao sentar.

Empurro tudo o que não fui com os pés

Brutalidade desconhecida em mim

Trato-os (me?) com desprezo tal

que o não chorar deles, ou fuga,

nauseia-me os pés.

Alguns, daqueles que nunca serei,

dialogam em sossego.

Absurdos eus palreadores do nada

frutos do vento inquieto

que sopra as vésperas do medo.

Aqueles que não sou

são todos reais

tão irremediáveis e subalternos

que os pressinto eternos

capazes de continuarem

estáticos em suas poses mímicas

até o final dos finais.

Eu, o tangível e verdadeiro

contemplo as crias de mim mesmo

abortadas.

Suas placentas de tédio

e monotonia foram devoradas

como fazem cães e gatos:

alimentosas.

Na parede há um retângulo reservado.

Lá, no espaço limpo, nunca houve quadro

mas existe a reserva.

Já está tudo pronto para um dia

quando todos resumir-se-ão ao retrato

Desses enormes, que procuram

açabambar toda a prole

de forma que sequer os antules

sobrem, bem íntimo e familiar.