LIBERTAÇÃO
LIBERTAÇÃO
Na angústia da minha liberdade
aprisiono-me e durmo ileso.
Todos os sonhos são celas vazias
trancadas pelo medo:
o meu medo de ti, meu espelho.
Refletido em mim, o teu receio.
Na porta, bato com o punho
trançado pelo desespero que
me foi legado.
Vozes clamam nomes
que as bocas não respondem.
Sou todo ouvidos, e libido,
com a palavra guardada.
A minha liberdade, obscena
em meu punho trancado,
é pura inquietação e dúvida.
Medonho e enojado
fujo dos lugares
levando comigo meu alforge
preparado para todas as viagens,
repleto de medo...E nojo
dos quais abasteço-me sem piedade.
Cruzo as duras paralelas da estrada,
afundo meu pé em pedras e cascalho,
para embarcar na condução que passa além:
o sorriso e esforço dos passageiros incomodam-me;
o sono dos homens incendeia-me
de um cansaço pastoso que não mata nem dorme
de tão enorme.
Meu pensamento vem água
e verte-se vinagre nas palavras.
Sou confusão e tédio acumulados
no sono pesado dos homens
que dormem ao meu lado.
Estou desperto e aceso
mas não movo-me ínfimo,
rescendendo a trabalho e libido.
No braço erguido do patriota aguilhoado
a angústia reflexiva
a liberdade dúbia
o medo estampado.
Passeio pela pradaria dos anciãos
que não tiveram mocidade,
pela planície dos jovens
que ‘inda ontem eram meninos
e hoje já tateiam abismos.
Sou todo fendas e rochas
mal reunidas, colosso de
sabedoria, crença, desejos,
mitos, que desaba em lentania.
Em minhas asperezas
unhas cravam-se em agonia:
sou eu tentando salvar-me
libertar-me de mim.
Liberdade que pende azeda dentro
da cela branca
Oscila, flutua tímida,
lampião aceso na claridade do dia.
No sonho do companheiro-patriota
ao lado, tão mal acomodado,
minha liberdade desfaz-se do bridão
e salta, livre, a cerca de mim construída:
sou livre apenas para ser o carcereiro
da minha própria liberdade.