INVEJA
INVEJA
p/ M.A.
Leio os versos da menina
que desconheço traço ou sina
Apenas leio seus versos, levemente
como quem apassarinha semente.
Cataratas abruptas dentro das palavras
Vou descobrindo, afogado nas águas
universo em desencanto, amor perdido
que em minha metáfora nunca vi traduzido.
Rosbife mal passado esse seu amor escancarado
sentimento sem remorso, cristal estalado
Apenas uma dôr, leve e risonha
pelo ausência de cheiros em suas fronhas.
À medida em que penetro nessa poesia
reporto-me a mim, quando singrava outros dias.
Lembra-me amor inocente, cartas que escrevia
e nunca postava: o remetente era o destino da missiva.
Tenho inveja dessa moça, desse amor declarado
da forma como descreve a ausência do amado.
É tão carregada de reentrâncias, umidades
humores revelando o corte em toda sua unidade.
Tenho inveja da poesia que ela faz sem medo
de revelar sua fragilidade, o erro, o acerto.
Tenho inveja do homem por ela amado
que não sabia que amor bom é o inventado .
Perdão! Mas invejo a franqueza crua em seus versos
Versos que jamais farei, posto não ser tão complexo
a ponto de declarar inquilino o instinto que me compele
a sentir pena de quem não soube ler além da sua pele
Leio seus versos enquanto a noite se adentra
pela casa, pelas palavras e por fim se senta
ao lado do homem que sabe que, do outro lado
o medo dela atrairá outro verso a ser invejado.