INOCÊNCIAS I

INOCÊNCIAS I

Meu filho dorme seu sono implacável

na boca secreta da noite.

Seus suspiros de frouxa lassidão

reverberam em minha aura de eremita.

Meus olhos são duas águias dos penhascos

aguardando, pacientes, a erosão dos píncaros.

Deito a cabeça, adormeço, ressucito

e digo a mim mesmo que amanhã

darei um jeito em meu coração:

(embora nunca cumpra promessas

fendidas a tristeza) serei feliz.

Abraço o estreito tronco do menino

e vou de mim desentranhar o temor

do dia que há de vir.

O garoto ressona, braços abertos.

Absorvo a calma desse sábado insone

injetando fórmulas miligramadas

preparadas por mãos nervosas

ansiosas por fugir à apatia

desse dia que não perdoa

e desponta da boca ferida da noite.

Os olhos do menino são louças

que com todo cuidado se mostram,

descortinam meu universo de caos

e se fecham, solenemente

sobre faianças

que os adultos empenham

para não perder o sono das crianças

até que adormeço

e meu ressonar é procela

ameaçando a bonança.

II

Quem perguntaria, nesta noite amena,

ao menino que dorme plácido:

que sonhas, broto de textura tenra,

que teus lábios desdobram sorriso

vago?

Insonio. Você dorme.

Eu finjo que vivo.

A noite a mim consome

em meu esconderijo

Esconde

Erijo

Rijo

Ouço vozes merencórias.

Noturnos sons.