CARANGUEJOS

CARANGUEJOS

Aos caranguejos da feira na rua Carlos de Sampaio

Do distante do mangue

Para as fieiras em praça pública

E de lá para as panelas das nossas

Valorosas cozinheiras

(agradecidos os homens bojudos

vos são pelas esposas, sr. Deus)

vão os caranguejos do mangue.

Enquanto não cumprem o destino

São motivos de risos e olhas! Infantis

Estraçalham-se, mutilam-se

Despreocupados

Sem saberem que não lhes daremos tempo

Para a possível regeneração.

Que afronta! Uns seres esquisitos

Sem formas apreciáveis

Esfacelam-se e reconstroem-se

Sem dificuldade

Enquanto nós, belos seres, e inteligentes!

Necessitamos dos préstimos do dr. Barnard

E outros, para continuarmos vivos;

Não podemos nos esfrangalhar

Em confusão multipartida de braços e pernas

Que outros não nascerão espontâneos.

Cai outra perna.

Tome-lhe chave de omoplata

E lá se vai outro braço:

Que humilhação. Em praça pública!

Os olhinhos telescópicos tentam entender

O que acontece na feira sabatina

Os gritos entristecem: compra galinha e leva o sangue!

Que queriam voltar para o escuro do mangue

Prosseguindo na estúpida vidinha

De cavar, procriar e comer

(seres bizarros, hediondos, sem nenhuma produtividade)

cai uma perna completa

Pendurados nas fieiras em cruz

Estão os caranguejos do mangue

Que por necessidade dos homens

Serão vendidos e executados

Nas panelas quentes do inferno do lar

(nossas eternas execuções necessárias)

onde as crianças gritam olha!

Para o estertor da garra que se abre em agonia

Depois servirão as carapaças para brincadeiras

Após devidamente sugadas

Extirpadas da carne branca, da vida

Os homens barrigudos lambem os beiços

Esticam-se em poltronas e tomam cervejas

A dona de casa, coitada

Lava os pratos

Cata os cacos que restaram dos brinquedos:

Aquilo que um dia fora belo caranguejo do mangue

Por necessidade do homem transformou-se

Em estranha pasta boiando no levedo.

Um belo caranguejo que por valentia

Se cortava, espedaçava e refazia

(que ousadia!...)