BONDE VELHO
BONDE VELHO
Reminiscências de Sta. Tereza.
Qualquer dia desses
Pego um bonde velho, um dia descarrilhado
Desentorto suas rodas
Ajeito-o nos trilhos, rangente
E sigo no bonde velho pelo leito férreo doente.
Em qualquer canto
Frearia o bonde
A parada não sei onde
( não teria os postes da cidade
os sons das paradas militares)
os trens das centrais do mundo
gritos dos filmes de horror.
Um bonde velho de passado indefinido
Seria o bonde aos pedaços,
Um super-homem feito em aço
A voar no céu enfumaçado
E Glorioso Ventre de Mãe Pátria
Ah, coisa à toa é essa séria desgraça.
Um bonde velho nos trilhos reluzentes
Bonde colorido de cinza e preto
Ferrugem e limo.
Seu apito rouco não atrai os olhos
A caldeira de cinzas não aquece as máquinas:
Velho bonde cheio de histórias.
Qualquer dia desses
Me embrenho no fim da curva do mundo
Na esquina do tempo
Na moradia do vento
Vou, neste bonde reavivado
Empurrando-o nas subidas
Encravado, teimoso
Não faz o menor esforço
Já gosta de ser levado.
Um bonde feito gente
Na decadência do céu que não entardece
A água que não sacia
A fome que não chega
Do meu bonde, dou risada das memórias
Que trago, uso, lavo, esfrego, enxugo.
Acho lágrimas nas telepresenças.
Neste bonde feito de esperanças
Não fujo, apenas me levo;
Não sonho, apenas relembro.
Qualquer dia desses, num bonde velho...