ANDAIMES
ANDAIMES
Algum dia iniciamos esta nova era
Inventando do nada este tempo.
O tempo enfadonho de começar tudo
Com a boca crestada de fumaça.
Talvez tenha sido por puro divertimento
Que alguém deu o tiro de largada.
O estampido ofendeu os ouvidos:
Disparamos na poleposição arranhando
Nossas ideiarias na cerca bem nutrida
De nossas intenções.
Talvez tenha sido puro entretenimento
E o resultado foi este: colisão.
É o tempo de homens colididos
Feito bólidos, na pista molhada
De nossos fastios
Os prédios não colidem
Mas os homens não são prédios
Apenas os fazem
E partem
Para colidir frente a frente logo em frente
Os prédios são armações duradouras
Mas os homens não resistem
Estrebuchando no acostamento
Desfeitos de suas musculaturas
Gemendo, arrependidos da aventura.
Alguém dá outro tiro
Preservando o esportivo espírito
De colidir sem nenhum risco.
Haja extrema-unção, que nem mais há.
Haja comentários nas mesas de botequins
Haja esquecimento breve
Que a gente esquece mesmo e colide de novo
Este é o tempo dos homens prometedores
(é sempre deles, o tempo)
e é o tempo dos homens da acreditadura.
Falamos n´outras palavras mais bem acabadas
As mesmas palavras faladas em outras salas
Por outras gentes de falar-vestir diferentes.
O tempo das reclamações e revoltas é sempre este
Que é o tempo dos insaciáveis
E dos canastrões.
Amanhã os filhos botarão as bocas no mundo
E como agora, no tempo todo ouvidos,
Não serão escutados quando falarem
Com outras mais belas ainda palavras
As agonias d´agora; que agora é o tempo
Das crenças invioláveis
Dos homens comprometedores:
Abre-se a porta e depara-se com o fiscal
Que é todo ouvidos neste tempo sem tímpanos.
Amanhã saberemos das melhorias
Do tempo de hoje. ficaremos saudosos
Andando pelas ruas do amanhã
Construídas hoje, falando sozinhos
Causando risadas nos meninos
Que serão malucos depois de amanhã
Mas não pensam nisso.
Nós, que construímos este belo tempo
Desconhecíamos algumas regras d´arquitetura
Por isso saíram os prédios meio guenzos
Esperando pelo amanhã que os arruma.
Os artífices que escalarem essas paredes
Falarão da fome do amanhã. Aquele tempo
Como falam os resmungões d´agora
Elevando paredes a mil metros por hora.
As meninas serão belas senhoras aposentadas
A reclamar dos motoristas
Da falta de vergonha das meninas avançadas
Com suas minissaias –será que resistem?
Abraçadas nos escuros das calçadas
À boa intenção de qualquer furto passante.
No tempo das considerações
Chegaremos a uma conclusão:
Este é o tempo das colisões
Por ter sido o tempo da promissão.
Porque, se fosse este o tempo da mudança
Decerto, as crianças de agora
Veriam que houve trabalho e liderança
Para prosseguirem empurrando a história.
No mundo miscigenado do amanhã
Nos chamarão de rubros idiotas
Enquanto abaixam-se com nossas cãs
Inocentemente calçando nossas botas.
(eis o tempo do leite estragado!)