ciclo
colhe um pouco de mim
mas de uma parte de mim
que não me chegue a doer
e me lave e me leve
e me livre de mim aos sábados
numa banca de feira qualquer
ou então me crave os dentes
e me grave e me beije e me grife
em mim a dor de minha podridão
depois me cuspa, me odeie e me esqueça
na calçada de uma esquina qualquer
daí um desavisado voador de asas incolores
virá colher minhas sementes no chão negro
pra logo depois também me cuspir
mas em terra fértil
pois que ressurjo, renasço
para mais uma vez me deixar colher
me lavar
me levar
me deixar
me cuspir
esquecer
e sempre
e tempos e tempos
e tempos tantos
assim
até que eu não sinta mais dor