afetos

Chegam-me afetos escritos a mão

abraços em tons azuis

letras que me afagam minhas horas ruins

chegam-me flores de um outono presente em mim

folhas de plátanos que esqueci numa calçada qualquer

emolduro as páginas

como tela que não se pudesse pintar

e guardo-a longe de todas as paredes humanas

longe de todos os olhos que se dão a serem apenas olhos

guardo os afetos escritos a mão

longe de cada desafeto meu

mas perto de cada lembrança de abandono

que é pra escrever sobre a certeza fria

a intensidade que há em mim de ser real

Versos dançam tangos argentinos

e a voz do velho Demasi se mistura à caligrafia

do grande e bom amigo Catarino

Nestas horas ruins

chegam-me afetos escritos a mão

e não me saem abraços de mim

não me saem bem escritos, meus afetos

que minha letra ainda é torta

que minha letra ainda não se sabe azul

de estrangeiras mãos

vêm-me considerações de outras vidas

chamados de outras almas

que querem meus olhos por perto

deuses de todas as línguas e nações

deuses de todas as letras

de todos os azuis

amparai este pobre diabo

dai voz e um outro coração

uma outra forma de sentir esses dias e horas ruins

pois que recebo afetos escritos a mão

e mal consigo erguer os olhos

Capiau da roça
Enviado por Capiau da roça em 30/06/2012
Reeditado em 01/07/2012
Código do texto: T3752833