afetos
Chegam-me afetos escritos a mão
abraços em tons azuis
letras que me afagam minhas horas ruins
chegam-me flores de um outono presente em mim
folhas de plátanos que esqueci numa calçada qualquer
emolduro as páginas
como tela que não se pudesse pintar
e guardo-a longe de todas as paredes humanas
longe de todos os olhos que se dão a serem apenas olhos
guardo os afetos escritos a mão
longe de cada desafeto meu
mas perto de cada lembrança de abandono
que é pra escrever sobre a certeza fria
a intensidade que há em mim de ser real
Versos dançam tangos argentinos
e a voz do velho Demasi se mistura à caligrafia
do grande e bom amigo Catarino
Nestas horas ruins
chegam-me afetos escritos a mão
e não me saem abraços de mim
não me saem bem escritos, meus afetos
que minha letra ainda é torta
que minha letra ainda não se sabe azul
de estrangeiras mãos
vêm-me considerações de outras vidas
chamados de outras almas
que querem meus olhos por perto
deuses de todas as línguas e nações
deuses de todas as letras
de todos os azuis
amparai este pobre diabo
dai voz e um outro coração
uma outra forma de sentir esses dias e horas ruins
pois que recebo afetos escritos a mão
e mal consigo erguer os olhos