Seresteiro

Seresteiro

maria da graça almeida

Na boca da noite, um riso sinistro

exala tal sopro de negro olor.

O peito da noite talvez seja visto

na hora em que a lua realça-lhe a cor.

O tempo passado vazou entre os dedos,

aguou a lembrança,sem dó, sem piedade,

lavou a memória, contou os segredos,

levou a alegria, largou a saudade.

A negra bocarra um riso escancara

e deixa passar a língua eleita,

que põe em declive a luz que ampara

os becos e as casas das ruas estreitas.

A velha seresta eleva e dispara

o canto em louvor às mágoas desfeitas.