Imprecisão
quisera ser preciso
como são precisos os sonetos de Koerig
como o gume de um punhal
e o aço dos olhos de uma última desonra
preciso
como a esquina e sua morte
sob o fiel lume da lua
eu preciso ser como a flor
cuidada por mãos que a sabem de ninguém
como a simplicidade com que Miguel cuida e salva
a princesa-dos-cipós da ruína de um fundo de lago sem sol
quisera ser preciso em cálculos
em gráficos, em trajetos e traçados
preciso em tudo que este mundo me impõe:
o que devo vestir
como devo falar em público
de que lado devo deixar o talher
o que não comer
como não comer
e, como depois de me saciar de poses,
ser preciso na arte de se dobrar um guardanapo
e não mandar todos os fantoches à merda
quisera ser preciso
nas filas de comunhão
nas feiras do sábado
na fé aos domingos
nas desistências das segundas e tantas terças
em alma
em olhos
em mãos
preciso ser
preciso em lentes e cores e graus
e ser reto e preciso
sempre e sempre
até que Ele desista de me escrever tanto
por linhas tão tortas