Flores Embalsamadas em um Deserto de Pintassilgos

Deixei as flores em lágrimas

O lírio em vestes atenuantes

Entre tantos bem me queres

Afogou-se nas maresias

Deixei as flores em lágrimas

E um beijo do beija-flor

Que saciou os lúgubres instintos

E morreu em terra estrangeira

Deixei o meu peito em flores

Coberto em tumulo secreto

E antes da poesia raiar

As lágrimas aguaram os jardins

Deixei o tempo e as flores em sarjetas

Pisoteadas por transeuntes insensíveis

E foram todas as pétalas mortas

Que embriagaram os sentidos do rei

Deixei o amor seguir seu curso

Como um rio em cálidas rosas

Sequei os afluentes dos teus olhos

Para enterrar todos os peixes e águas-vivas

E em outros jardins plantei sóis

Plantei cactos e voltei para Aruanda

Juntei as tralhas de um viajante

E fugi do mundo em carruagem incandescente

Deixei todas as flores em lágrimas

Embalsamadas em frascos de Netuno

O pintassilgo trinou e exilou-se

Restaram apenas duas penas amareladas

Morri entre os cadafalsos e os pirilampos

Iluminaram minha lápide de lápis-lazúli

Refletindo os sonhos de um porvir em pérolas

Entre todas as turmalinas e alguns caracóis

Deixei uma ou outra frase escondida em símbolos

Para os criptógrafos morrerem junto aos desertos

Procurando as flores que não brotaram

Procurando os frascos de lágrimas de um plebeu

Deixei as flores renascerem e colorirem meu semblante

Para poder voar entre as águias dos meus pensamentos

Aturdido em devaneios e gritando entre ecos o amor

Vou seguindo perambulando entre os planetas extrassolares

Da minha janela entreaberta mirei mais uma vez aquele lírio antes de partir...