Vergonha
A comida era pouca,
a fome era uma companheira
de luta e rufúgio...
o amor nem se fala,
acho que nem rico
tinha esse artigo raro.
a casa ficava bem
arrumada, pra esconder
o sujeira do coração...
a raiva, a agonia
a injustiça de não
acreditar-se gente,
somente corpo
somente fome
e vontade de foder...
de Madrugada
só se ouvia grunhido
de gente se amando...
com ódio, feito bicho...
Entre a parede
Da sala
E da cozinha
havia
uma porta,
lá fora havia
um corredor espichado
até o quintal...
mal-cuidado e frequentemente
muito vermelho de cera barata...
tudo pra deixar a vida esteticamente
embelezada
uma casca fina de repugnancia
logo primeiro, O
Quarto de Manoelito Ferraz
e de Maria d'a Juda Rosa...
Cozinha com despensa
Fogão a lenha.
toda forrada de fuligem!
um tanque desativado
à esquerda...
tanque de água
e não de lavar roupa...
Sete potes de água
espalhado pela casa
nenhum era decoração
todos era cheio d'água...
podia-se beber água
em toda a casa...
água colhida, como se
colhe uma cana no pé,
na bica no xafariz da rua
Santos Dumond
treze latas de água
na cabeça de Railda
Rosa de Jesus.
que Deus lhe abençoes
Mais adiante
Dois banheiro
Um de tomar banho
Outro de cagar...
O quintal era pobre
Um coqueiro
E algumas hortas
Vez ou outra na vida...
Dentro de casa, perambulando
entre a sala, que também
havia dois quartos, um
que só dormia mulheres
outro, que dormiam homens,
14 pessoas mortas
de vergonha!