Para o meu irmão

passo os pés às mãos

e me avesso de mim

se não gostares do que me vês

na orla branca daquelas tardes

daqueles dias ruins

eu te admirava tanto

quanto me vestia de ti

és grande e belo e irmão

e és de tão depois de mim

pois que não se contam teus dias

por esses nossos dias tão mortais

me fiz mais velho

me quis mais velho

pra poder cuidar de ti

a minha insignificância

minhas mãos que não se adiantavam em nada

em letras de chumbo

mostraram-se hábeis

em dissonantes cordas

daquele violão que esqueceras no canto do quarto

e pra esconder meu rosto

serviram-me sempre

serviram-me bem

ainda assim

essas descuidadas mãos cuidavam de ti

que és belo e imenso e irmão

mas certamente não te lembras daquelas tardes

eu sei

e sei também que não te foram ruins

aqueles dias tristes

sei bem

assim como sei que não sabes que te escrevo

não sabes que te protejo ainda em distância

e cubro teu rosto de tudo que não convém

e com minhas mãos não tão incapazes assim

te abraço de longe

e me avesso de mim

se não gostares do que me vês

Capiau da roça
Enviado por Capiau da roça em 07/06/2012
Reeditado em 07/06/2012
Código do texto: T3711503