Viver
Gosto de um dia frio,
de ver a tormenta no mar
lindamente revoltado,
ouvir os gritos do vento,
através das frestas da janela.
Gosto de um dia quente,
de me aquecer sob o sol,
ver o espelho calmo das águas,
o brilho das cores iluminadas.
Gosto de um banho de chuva.
Gosto da noite,
das estrelas, da lua,
do silêncio e da escuridão.
Gosto de música
de todos os ritmos,
de todos os sons.
Gosto até da dor
que se converte em prazer.
Gosto do desconhecido,
do mistério oculto e velado,
só para ter chances de aprender,
de me surpreender com algo.
Gosto de sorrir e até de chorar.
Gosto de sentir minhas tormentas,
revirar minhas próprias águas,
filosofar sobre o voo das borboletas,
inventar teorias,
defendê-las, refutá-las,
trocá-las por outras.
Gosto de crer e de duvidar.
Duvido tanto,
que chego a duvidar
que realmente duvido.
Assim,
ora crente, ora descrente,
dividido entre dias e noites,
frio e calor,
sol, lua, estrelas,
sons, silêncio,
cores, luzes e escuridão,
eis que me fiz vivo,
pulsante, inconsequente,
livre, enfim.
Fiz da minha vida
parte da vida do mundo.
Não nego meu cálice.
Bebo intensamente
do que me oferece a existência,
e vejo que há beleza nos meus dramas.
Que mais posso querer?
Tristes ou alegres histórias,
são lindas em minha comédia dramática,
piada e encenação de um eu maior.
Que sabe uma personagem da beleza de seus dramas?
Está presa demais neles, para vislumbrar a cena!
As histórias são só manifestações de arte:
Uma Arte Real, fora do papel,
onde o papel somos nós
e a tinta é a própria vida.
Brinquemos, criemos, atuemos,
façamos tudo isso intensamente!
Sorrateiramente, há um outro eu,
por detrás dos véus e cortinas da coxia,
que sorri ao ver o teatro que concebeu.
Hoje, só hoje, sorrio com ele.