A lua,

içada ao céu sonâmbulo,

estende-se em prata na noite nácar

e faz lembrar cantigas tontas de enleio

e faz lembrar gestos lançados ao infinito

das noites que se demoram a olharem-se no mar

e no mar encontram outra razão,

um adeus,

talvez,

o sussurro

trazido na pressa das ondas difusas

onde o poema pára o tempo

e se distende no instante castanho-verde

dos teus olhos

que brincam dentro da noite

sementes de estrelas

lançados ao céu para germinar

letras contidas por este trema

que as aparta

têm brilho, sons e cores

de apaniguados amores

mimos

versos

sonhos

rimas

fulgindo entre silêncios

que o movimento do mar segrega

e se embriaga

na tua pele de seda

no fogo

cançao crepitante em desertas praias

chamando você

para ver a lua

içada ao céu sonâmbulo,

estender-se em prata na noite nácar

quem dera, nesta noite, fosse meu o amor

e amar fosse o bastante

para arrastar meu destino

porta a dentro da tua casa

o vento chora o que digo

sonho de poeta

ilusões de amigo

assim como não há um verso novo

assim não há amor antigo

neste outono

de cores maduras

ocres

brincando nas meias-tardes

de chuvas fininhas

de vermelhos e lilases no céu

onde a lua apanha o teu sorriso

e ilumina a minha rua

o poema

insiste em sentir,

intrinsincamente,

o que dói nas palavras

não ditas

nas meias palavras que teimam

em morrer na minha janela

nas meias-tardes de chuvas fininhas

guardo o teu nome

na minha voz

no meu dia de lua cheia

na minha noite ensolarada

a vida, assim, assim,

a vida pelo avesso

o passado aqui ao meu lado

olhando pela fresta

da nossa impossibilidade

O vento sopra ao longe

as gotas de uma chuva

que até hoje chove em mim

o vento

vai

e vem

e volta

e traz de volta

você

num cheiro

de terra úmida

flor na janela

poesia na lapela

sonho fazendo barulho

misturando letras e histórias

que vadiam em minhas mãos

procurando sintaxes

que as façam viver a vida aqui fora

ou rimas que as façam em poesia

como as que os sinos declamam

falando de horas e tempos

dos homens e suas noites

e da vontade de ficar só

só pra saber

com quantos adágios

move-se meu movimento

agora que o amor acabou

e deixou apenas a minha sombra no espelho

e este gosto de eterno

da vida que vem com as chuvas

molhando a primavera quase verão

até que a poesia,

entediada,

ao invés de dizer o teu nome

dissesse não